Luanda: consumo de drogas por jovens e adolescentes entre desafios do bairro Golf 2

Vulnerabilidade social, ausência de apoio psicológico e acesso fácil às drogas estão a empurrar crianças e adolescentes do bairro Maria Eugênia Neto, distrito do Golf 2, no município do Kilamba Kiaxi, para o submundo das substâncias psicotrópicas. Famílias e escolas pedem apoio urgente.

O cenário é preocupante. No bairro Maria Eugênia Neto cresce o número de menores entre os 13 e 16 anos envolvidos no consumo de liamba, xaropes e até comprimidos controlados. A situação é agravada pela pobreza, abandono familiar e, pela ausência quase total de apoio psicológico nas escolas e na comunidade.

O bairro Maria Eugénia Neto no distrito do Golf 2, município de Kilamba Kiaxi, localizado entre a avenida Pedro de Castro Vandune-loy e o condomínio da Sonangol, no Camama, tem esta realidade todos os dias. O conhecido campo da mamã Ani e o quintalão do CDA, são os principais locais onde facilmente se podem encontrar crianças e adolescentes a fazer uso de substâncias psicotrópicas como liamba, diazepam e xaropes, sem qualquer receio.

O adolescente Adriano (de nome fictício), faz o uso dessas substâncias desde os seus 12 anos de idade. Hoje com 17 anos, diz que entrou para esse submundo influenciado pelos amigos. Questionado sobre o conhecimento dos pais da sua relação com as drogas, respondeu que aos 14 anos foi duramente repreendido e com advertência para deixar de consumir, mas confessa que enfrenta dificuldades para livrar-se do vício.

“Quando os meus pais descobriram, fui duramente repreendido e jurei nunca mais voltar a usar essas substâncias. Mas não consegui parar de usar, eu sinto que isto já é algo crónico”.

Apesar dessa realidade, Adriano diz que ainda tem controlo sobre si, por isso é que continua a estudar, estando a frequentar a 7ª classe, num colégio da comunidade com os custos suportados pelos próprios pais.

Aos 17 anos de idade, Eduardo (de nome fictício) experimentou pela primeira vez a liamba. Passados cinco anos, tornou-se tóxico-dependente, tanto é que hoje, contou ao Notícias de Angola, ao acordar e antes de deitar-se socorre-se a um ‘kuxi’.

A falta de condições económicas por parte da sua família levou-lhe a parar de estudar na 7ª classe, já que no bairro não existem escolas públicas.
Adriano e Eduardo vivem a mesma realidade. Para além de vizinhos e amigos, partilham o mesmo rótulo social de tóxico-dependentes e de constantes acusações de roubos e assaltos na vizinhança.

Esmael (de nome fictício), irmão mais velho de Eduardo, afirma que têm passado por muitas dificuldades em casa. Seus pais são consumidores de bebidas alcoólicas e não têm prestado atenção devida aos filhos, por isso acredita que esta situação terá contribuído para o estado em que se encontra o seu irmão mais novo.

Reação da comunidade

Pais e encarregados de educação, bem como directores escolares e líderes religiosos mostram-se preocupados com esta realidade que se vive naquele bairro da capital do país.

“Já encontrámos alunos a fumar liamba dentro da escola”, revela o director do centro educativo Bom Saber, Matondo Bernardo.

Segundo o responsável, a falta de segurança e o fácil acesso às drogas nas redondezas tornam o ambiente escolar vulnerável.

“Eles escondem nas mochilas ou recebem pelos colegas na porta da escola”, denuncia.

O vice-presidente da comissão de moradores do bairro Maria Eugênia Neto, Adriano António Cassule, no sector 6 do Golf 2, vive na comunidade há mais de 26 anos e considera alarmante o consumo de substâncias psicotrópicas entre os menores.

“No bairro há muitos jovens viciados em drogas, e muitos deles são filhos de autoridades, líderes religiosos e outros cidadãos influentes. Já presenciei diversas vezes jovens a consumirem droga mesmo em frente à minha residência”, afirmou.

Segundo Adriano António Cassule, a comissão tem mantido contactos frequentes com a polícia e com o comando municipal, solicitando a instalação de uma esquadra móvel no bairro, para reforçar o combate à criminalidade e ao consumo de drogas. Mas, até agora não tiveram qualquer resposta do governo provincial.
Aquele responsável acrescenta que a Comissão de Moradores enfrenta também dificuldades estruturais:

“As obras de construção do posto físico para a comissão encontram-se paradas por falta de recursos. A presença de uma esquadra móvel e de um espaço funcional para a comissão no bairro é um dos nossos principais desafios actuais”, lamentou.

“A igreja tem feito a sua parte, com aconselhamentos e com a realização de actividades para jovens, campanhas de evangelização, mas não é suficiente. É preciso uma ação conjunta entre famílias, governo e igrejas. A droga destrói sonhos, e só com fé, orientação e oportunidade podemos resgatar esses adolescentes”, explicou o pastor da Igreja Pentecostal (Deus é amor), Moisés Adão.

O psicólogo clínico, João Mabene, alerta que muitos desses adolescentes apresentam sinais claros de trauma, ansiedade e depressão.
“Por não haver psicólogos nas escolas, a maioria desses jovens nunca foram ouvidos por um profissional de saúde mental”, explica.

Por: Bernardina Bernardo

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