Notícias de Angola – Os subsídios aos combustíveis representam uma fatia considerável do Orçamento Geral do Estado (OGE). Em 2022, mais de 2,15 bilhões de kwanzas foram gastos neste apartado, mais 60% que no ano anterior, segundo o relatório anual divulgado pelo Instituto de Gestão de Activos e Capitais do Estado (IGAPE). Este valor, note-se, representa 92% das despesas dos sectores de Saúde e Educação no OGE.
Por: Jorna de Angola
Face às carências sociais e às dificuldades de muitas famílias angolanas, vários especialistas começam a defender a realocação de parte dos subsídios de combustíveis em programas como o “Kwenda”. Argumentam que, se estes montantes impressionantes fossem canalizados directamente para os sectores sociais, ajudariam a aliviar de forma muito mais efectiva a pobreza e a exclusão económica.
O “Kwenda”, em particular, tem mostrado resultados concretos em todo o país junto de famílias em situação de extrema vulnerabilidade. Com um financiamento de 420 milhões de dólares, desde a sua implementação, em 2020, já beneficiou 610 mil 382 agregados familiares com pagamentos directos de 33 mil kwanzas trimestrais.
Além das transferências, o Kwenda conta com um Cadastro Social de mais de 3 milhões de pessoas em situação de vulnerabilidade em todo o país, uma ferramenta essencial para delinear políticas de combate à pobreza, e que precisa de recursos para ser ainda mais robusta e ampla.
O projecto tem também as componentes de Municipalização da Acção Social, através da criação dos Centros de Acção Social Integrados, e de Inclusão Produtiva – apoio às famílias vulneráveis para iniciar actividades geradoras de renda em áreas como a agricultura, pecuária, pesca, artesanato, cultura, turismo rural e ambiente, transformação de produtos agro-pecuários, fundos e caixas comunitárias e energias renováveis.
Com estes instrumentos, a iniciativa lançada pelo governo angolano, e implementada pela agência governamental Fundo de Apoio Social (FAS), está já a dar resposta aos desafios socioeconómicos das comunidades mais vulneráveis, com um impacto gigantesco. O Kwenda permite também a circulação de um maior volume de dinheiro nas áreas rurais, aumentando o índice de bancarização de populações tradicionalmente excluídas do sistema financeiro.
Ao investir uma parte dos fundos de subsídio aos combustíveis no programa Kwenda, que apoia as áreas da Educação, Saúde e combate à pobreza, o governo estaria a promover de forma ainda mais contundente mudanças positivas, elevando os padrões de vida, promovendo o desenvolvimento sustentável e criando uma sociedade mais inclusiva e equitativa, tal como aconteceu noutras partes do mundo.
É importante realçar que o sistema de transferências sociais monetárias, que caracteriza o programa Kwenda, é um modelo com resultados comprovados a nível internacional. No Brasil, entre 2003 e 2021, o famoso “Bolsa Família” retirou pelo menos 3,4 milhões de pessoas da pobreza extrema e ajudou a reduzir 16% da mortalidade infantil. Ao mesmo tempo, ajudou a diminuir a desigualdade regional, a melhorar a participação escolar e a aumentar os índices de segurança alimentar. Este ano, os especialistas estimam que o “Bolsa Família” deverá tirar mais 3 milhões de pessoas da pobreza extrema no país. O programa beneficia actualmente 21,1 milhões de famílias, e terá uma influência importante no crescimento do Produto Interno Bruto do país, este ano.
Noutras latitude, na Índia, o sistema de transferências sociais monetárias beneficiou centenas de milhões de pessoas, com especial incidência nas mulheres, idosos e agricultores. O Fundo Monetário Internacional considerou o programa uma “maravilha logística”, pela execução e resultados.
Num mundo globalizado, e bebendo de experiências de outros países, o programa Kwenda faz a diferença. Os subsídios de combustíveis foram pensados para ajudar as economias familiares, é certo. Mas a sociedade e economia angolanas já não são as mesmas de há uns anos. Reconhecendo a necessidade de encontrar um equilíbrio entre considerações económicas e bem-estar social, é fundamental analisar a eficácia desta política no combate à pobreza e no fomento de desenvolvimento, em detrimento de programas sociais de maior impacto.
Não seria nada inédito. Esta semana, a Nigéria eliminou os subsídios aos combustíveis para aliviar as finanças públicas, revertendo os montantes bilionários para investimentos em infra-estrutura pública e melhoria das condições de vida das populações.
Tal como na Nigéria, se em Angola uma parte dos enormes valores que o Estado investe para garantir preços artificiais de combustíveis fosse direccionado para iniciativas como o “Kwenda”, que têm uma acção directa no terreno, o impulso para desenvolver o nosso tecido social de forma harmoniosa e sustentável seria enorme. Recursos há. Vamos pensar nisso.