Notícias de Angola – É frenético por natureza. Para Hélder Garcia, há que dar movimento ao estático, porque a Luanda que vive e retrata é um imenso caos de empurrões.
O jovem hiper-realista e vencedor da categoria de Arte dos Prémios Tigra Nova Garra 2022 volta a ser protagonista de uma iniciativa cultural apoiada pela marca, a exposição “For a New Tomorrow”, que arranca hoje na galeria Jahmek Contemporary Art, no Hotel Globo.
Por: NA
Nos últimos dias, Hélder Garcia tem-se tentado distrair. Esforça-se por não pensar demasiado no momento em que “For a New Tomorrow” abrir portas, na galeria Jahmek. “É a minha primeira exposição como artista. Desde que comecei a produzir, há cinco anos, só publicava as minhas obras nas redes sociais e recebia algumas dicas. Mas agora vou ver pela primeira vez, cara a cara, a reacção das pessoas ao meu trabalho, ouvir os seus comentários. Vai ser tudo muito real e isso deixa-me um pouco ansioso”, revela, com um sorriso aberto de quem está “feliz”.
O caminho para chegar ao Hotel Globo começou em Maio passado, quando Hélder Garcia venceu a segunda edição dos Prémios Tigra Nova Garra, na categoria de Arte. O “impacto na minha vida foi imediato”, comenta o jovem que se afirma autodidacta. “As minhas primeiras experiências artísticas foram com a Tigra. Antes dos prémios, não conseguia sequer citar cinco artistas angolanos, nunca tinha ido a uma exposição de arte, pensava que nessas mostras só havia fotografia e pintura e nada mais”.
Os últimos meses têm sido “de descoberta”. A participação em “For a New Tomorrow”, a convite de Meahk Vieira, jurada de Arte nos Prémios Tigra Nova Garra e co-fundadora da galeria Jahmek, culmina um ano “tão importante como improvável”, adjectiva. “Para além de ser uma oportunidade única para mim, todos os artistas que participam no projecto trabalham um tema que é muito meu, o da cidade de Luanda e as nossas rotinas. Identifiquei-me de imediato”.
A participação do jovem em “For a New Tomorrow” é uma parceria com Magno Daniel, fotógrafo que, com Hélder Garcia e também com Resem Verkron, Lilianne Kiame e Irene A’Mosi, forma o grupo que estará em destaque na exposição no Hotel Globo.
Nesta colaboração, conta então, “partimos de cinco fotografias a preto e branco do Magno, que ilustram o olhar calmo e tranquilo que ele tem sobre a cidade”. “O desafio”, detalha, “foi dar cor a essas imagens”. Inspirado na “Luanda frenética” (em) que vive, “feita de empurrões para entrar nos táxis ou de esperas intermináveis em filas para aceder a serviços básicos”, o artista de 26 anos deu cor a pequenos elementos da fotografia original, “uma sombra, um elemento disperso”, transformando-os com o objectivo declarado de “abordar temas que afectam a nossa sociedade”.
Ao intervir na obra de Magno Daniel, Hélder Garcia quis “ir mais além do olhar puramente contemplativo” e “criar um elemento de conexão com quem vir a obra”. “Sempre tive essa necessidade de me ligar às outras pessoas através da arte e de projectar vidas nas minhas telas. O meu trabalho é muito mais para os outros do que para mim. Não quero falar tanto do que sinto, mas da mudança que posso provocar”.
Explodir cabeças
No exercício sobre “o novo amanhã” que é a exposição “For a New Tomorrow”, o jovem do Zango sabe bem onde se quer posicionar. “A minha consciência colectiva, que parte do individual, forma-se nas ruas, nas conversas com amigos e conhecidos”, comenta. E o que tem ouvido ultimamente não lhe agrada nada. “Há um sentimento cada vez maior entre os jovens de ‘quando conseguir, pego nas minhas coisas, bazo para outro país e não volto mais’.” “Entendo as dificuldades que existem”, diz, “mas realmente espero muito mais da nossa juventude”. “Sem importar de onde estamos, aqui, lá fora, não podemos desistir, o nosso contributo é fundamental. No que me toca, quero ajudar o meu país, quero ver o meu país melhor, se não for para mim será para os meus filhos. É o que espero como pessoa e artista”.
O caminho desta “intervenção social, mais que cultural” que espera incitar com o seu trabalho está lançado. A exposição “For a New Tomorrow” dará a Hélder Garcia um “protagonismo colectivo” que o põe, por fim, num circuito importante, mas nem sempre paciente. “Uma das maiores dificuldades que tenho no meu trabalho é que as pinturas hiper-realistas podem demorar meses a ser feitas”, explica. “Como tenho ainda poucas obras, não faz sentido apresentar-me sozinho, e numa fase inicial de uma carreira, quando precisamos de visibilidade, isso pode ser prejudicial. Neste sentido, esta oportunidade de participar numa mostra colectiva é fundamental para consolidar o meu percurso”.
Enquanto espera, ansioso, as reacções das pessoas às suas obras em carne viva, prepara já a próxima obra com a qual tentará superar o que considera “o trabalho mais bonito” que já fez e que o tornou conhecido nas redes sociais – “Caos”, um retrato de Luanda num dia de chuva (pintura, vídeo e áudio, meios que usa em simultâneo nas suas peças). “Mas desta vez vai ser uma coisa diferente”, atira. “No próximo ano, vou trazer algo que, preparem-se, vai explodir as vossas cabeças!” Está o aviso feito.